sexta-feira, 28 de agosto de 2009

UMA AVALIAÇÃO PERIÓDICA DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL

A Emenda Constitucional nº 42, de 2003, dentre outras alterações, deu ao Senado Federal uma nova competência: avaliar periodicamente a funcionalidade do sistema tributário nacional, em sua estrutura e componentes, e o desempenho das administrações tributárias da União, dos Estados e do Distrito Federal e dos municípios. É o que determina o artigo 52, inciso XV, da Constituição Federal. Decorrência disso, já em 2004, deu-se início à tramitação, no Senado, do Projeto de Resolução do Senado nº 13, de autoria do Senador Ramez Tebet, que acrescenta às competências da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) daquela casa a avaliação periódica do sistema de tributos no Brasil. De acordo com a proposição, prevê-se a realização de pelo menos uma avaliação, no período de uma legislatura, com elaboração de relatório final. Além disso, podem ser solicitados depoimentos de autoridades federais, estaduais, distritais e municipais, bem como informações aos entes federados, relacionadas ao desempenho das respectivas administrações tributárias.



Sem prejuízo desses tópicos, a avaliação periódica do sistema tributário nacional engloba o exame da complexidade e extensão da legislação tributária, que acaba afetando a segurança jurídica das relações entre o Estado e o contribuinte. Segundo apuração do Instituto Brasileiro de Pesquisas Tributárias de São Paulo, entre outubro de 1988 e outubro de 2007, foram editadas quase 236 mil normas tributárias, nos níveis federal, estadual e municipal. Afora o aspecto quantitativo, cabe mencionar que normas tributárias são, geralmente, de difícil compreensão pelo cidadão-contribuinte, gerando um verdadeiro contingente de "analfabetos tributários", dificultando o próprio exercício da cidadania.



Ademais, esse cipoal tributário, acaba elevando os chamados custos de conformidade, que envolvem despesas como contratação de escritórios e assessorias especializadas, busca por bancos de dados de legislação e fiscais, obtenção de certidões e declarações na burocracia estatal. Estimativas indicam que esses custos são da ordem de R$ 11,4 bilhões anuais. Isso quase equivale aos recursos destinados ao Programa Bolsa Família, que em 2008 aplicou R$ 11,8 bilhões. Nada impede, portanto, que, no âmbito do processo legislativo do Congresso Nacional, promova-se a consolidação da legislação tributária federal, o que já representaria um grande avanço institucional. É bom lembrar que, de acordo com o artigo 212 do Código Tributário Nacional, exige-se que os poderes executivos federal, estaduais e municipais consolidem, em texto único, a legislação relativa a cada um dos tributos, repetindo-se esta providência até o dia 31 de janeiro de cada ano.



O Senado poderá ainda, no exercício da sua competência avaliativa e, reforçando o papel do controle externo do Congresso Nacional, aferir os efeitos regionais da política de renúncia de receitas tributárias do governo federal. Trata-se de tema relevante e de índole constitucional, a ponto de a nossa carta política exigir que a lei orçamentária anual esteja sempre acompanhada de demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, das isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia. Ao caminhar nesse exame, o Senado obteria uma radiografia regionalizada da política de incentivos tributários nas diversas esferas de governo, permitindo avaliar a coordenação dessas políticas e mensurar seus resultados globais.



É competência exclusiva do Congresso Nacional, conforme artigo 49, V, da Constituição Federal, sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar. Assim, na avaliação periódica do sistema tributário nacional, pelo Senado, caberia levantamento específico de eventuais normas infralegais que estejam inovando o direito tributário e, portanto, ferindo o princípio da reserva legal e do devido processo legislativo. A discussão sistematizada e regular sobre a prática legislativa da administração tributária, no âmbito da Comissão de Constituição e Justiça da casa, criaria um fórum adicional de debate sobre questões que dizem respeito à segurança jurídica nas relações entre a administração tributária e os contribuintes.



Em dezembro de 2008, tivemos a conclusão dos trabalhos da subcomissão temporária da reforma tributária, composta pelos senadores Tasso Jereissati, Francisco Dornelles e Neuto De Conto, que apresentou várias sugestões para a construção de um novo sistema tributário nacional. A experiência desse grupo parlamentar é, sem dúvidas, uma base para a efetiva regulamentação da competência constitucional atribuída ao Senado de avaliar periodicamente o nosso sistema de tributos. O exercício dessa atribuição, além de qualificar o debate parlamentar, reforça uma das funções precípuas da casa, que é a de zelar pelo equilíbrio da federação que depende, sobremaneira, da funcionalidade do sistema tributário nacional.



(Texto extraído do Jornal Valor Econômico de 27.08.2009)

Helder Rebouças
Consultor de orçamentos, diretor de coordenação técnica da presidência do Senado e professor de direito financeiro em Brasília.